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Sindrome de Down (vídeo)
Entrevista à Dr. Raquel Amado
(Fsioterapeuta que lida com crianças com Síndrome de
Down)
1. Há quantos anos trabalha com crianças com este tipo de síndrome? R: Sou fisioterapeuta há 2 anos e já trabalhei com crianças com síndrome de down mas neste momento não o estou a fazer. Desde Janeiro deste ano que integro uma equipa de técnicas (fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, terapeuta da fala, técnica de reabilitação psicomotora e psicóloga) da CERCI - Flor da Vida (Cooperativa de Educação e Reabilitação de Cidadãos Inadaptados), que presta apoio a crianças com necessidades educativas especiais nos agrupamentos de escolas do concelho da Azambuja e de Alenquer. Estes projectos de parceria, pretendem uma melhor inclusão social destas crianças no ensino regular e na comunidade envolvente, disponibilizando um conjunto de serviços/apoio técnico especializado à criança, família e professores. Neste momento apenas está referenciada uma criança com esta síndrome, que é acompanhada pela terapeuta ocupacional. Como fisioterapeuta presto apoio a crianças, integradas no ensino regular, com paralisia cerebral, atrasos do desenvolvimento motor, perturbação da hiperactividade com défice de atenção entre outras. 2. Que tipo de tratamentos executa nas crianças? R: A Síndrome de Down é caracterizada como uma condição genética, em que a criança apresenta uma série de características físicas e mentais específicas. Muitas vezes estas crianças necessitam de acompanhamento de fisioterapia, cujo principal papel é potenciar o desenvolvimento mental e motor da criança proporcionando uma maior longevidade e uma melhor qualidade de vida. A criança portadora da Síndrome de Down é muito dócil depois de conquistada, e antes de qualquer técnica específica de estimulação, é importante o fisioterapeuta brincar com a criança, perceber os seus gostos, as suas brincadeiras preferidas, e aquilo de que não gosta. O fisioterapeuta pode actuar em várias faixas etárias. Numa primeira fase, quando estas crianças ainda são bebes devo valorizar o seu desenvolvimento motor. Certamente que sabem, que o desenvolvimento do bebe é sequencial primeiro controla a cabeça, depois começa a rolar, mais tarde já se senta, por fim gatinha, anda e corre. Ora cada uma destas aquisições acontece a determinada idade (meses), mas nas crianças com trissomia 21 estas aquisições são alcançadas mais tarde, daí se falar em atrasos do desenvolvimento motor. Por exemplo um bebe, dito normal, andará por volta do 1º ano, estas crianças podem andar só por volta dos 3 ou 4 anos. Aqui o fisioterapeuta deve estimular, através das mais diversas brincadeiras estes comportamentos motores. Uma das características principais da Síndrome de Down, e que afecta directamente o desenvolvimento psicomotor é a hipotonia generalizada (músculos moles e pouco activos), presente desde o nascimento, e se desde cedo estas crianças forem sendo estimuladas e acompanhadas pelo fisioterapeuta, iremos potenciar as suas capacidades motoras e psicológicas. Numa segunda fase, na qual há maior independência motora, em que a criança vai para o jardim-de-infância ou para a escola primária, também pode ser necessário a intervenção do fisioterapeuta, pois há necessidade de trabalhar especificamente o equilíbrio, a postura e a coordenação de movimentos. Aqui o fisioterapeuta deve incentivar a criança e a família para a prática de exercício físico, que é essencial para se estimular a sua motricidade global. Na sequência do desenvolvimento do indivíduo, em primeiro lugar vem a postura, depois a acção motora, para depois vir acção mental. Isto quer dizer que qualquer acção mental, organizada, dependerá de um sistema postural bem estruturado e consequentemente de movimentos intencionais bem organizados. Se a estimulação é importante para qualquer criança com ou sem atraso no desenvolvimento, a criança com S. Down tem essa necessidade muito mais inerente de experimentar situações e conviver com pessoas diferentes às do seu ambiente. A hidroterapia poderá ser útil aos portadores da S. Down, pois o ganho de força muscular para pacientes com Síndrome de Down pode ser conseguido através da resistência da água ao movimento, além disso é um óptimo meio para potenciar o relaxamento e socialização da criança, uma vez é um ambiente agradável e rico em estímulos, onde são realizadas actividades lúdicas que envolvem objectivos terapêuticos. Outro recurso que pode ser utilizado é a Hipoterapia em que a interação com o animal propícia à criança atingir novas formas de comunicação, socialização, concentração, equilíbrio, coordenação motora, consciencialização postural e ganho da auto-estima. Numa terceira fase, temos aquelas crianças e adultos que recorrem à fisioterapia por problemas secundários à patologia, ou por falta de estimulação durante o seu desenvolvimento, como por exemplo as alterações posturais que resultam dos encurtamentos musculares que foram sofrendo ao longo da vida. 3. Trabalha em várias escolas não é verdade? Existem muitas crianças com este síndrome em escolas “normais”? R: Sim, como já referi trabalho em escolas do concelho de Alenquer e da Azambuja, através de um projecto de parceria entre os agrupamentos de escolas e a CERCI Flor da Vida. Neste momento, está referenciada uma criança com Trissomia 21, que é apenas acompanhada pela Terapeuta Ocupacional. No entanto pelo que sei através de colegas que trabalham noutras escolas, cada vez mais estas crianças são integradas no ensino regular. 4. Como é que as outras crianças lidam com crianças com S.Down? R: Bem é uma pergunta difícil, apenas posso falar sobre aquilo que já vivenciei. Eu penso que de um modo geral, estas crianças são bem aceites pelos seus pares. Cada vez mais as pessoas estão abertas para a temática da Inclusão Social e da Escola Inclusiva, no entanto é necessário informar e educar a comunidade (professores, alunos, auxiliares e pais) à volta da criança com Síndrome de Down, sobre o verdadeiro significado e características desta patologia. Se as pessoas que contactam com estas crianças perceberam que elas sentem, riem, choram, brincam como as restantes, apenas têm um “ritmo” diferente, então aí a criança irá sentir-se acolhida e amada pela comunidade e isso, facilitará todo o seu processo de aprendizagem quer escolar quer pessoal. Todos nós sabemos que cada vez mais a comunicação social aborda esta temática, quer nos noticiários ou até em telenovelas, ora isso é muito importante na formação dos nossos ideias e valores, no entanto não podemos ficar por aqui, parte de todos nós integrar estas e outras crianças na escola/sociedade. Com isto quero dizer, que os professores devem abordar o tema da Trissomia 21 com os seus alunos (não só aqueles que têm um colega com a síndrome, mas toda a comunidade), os alunos devem falar sobre este assunto com os pais e com os seus amigos. Se houver uma corrente de informação correcta entre todos estes elementos não haverá motivo para as crianças se relacionarem bem com outras colegas que tenham a síndrome. 5. As crianças com S.Down adaptam-se bem? R: O conceito adaptação não é unidireccional, isto é as crianças com S. Down adaptam-se à comunidade escolar e a comunidade escolar adapta-se a ela. Assim é fácil perceber que se houver uma comunicação eficaz entre as duas partes a adaptação será boa. Estas crianças, de um modo geral, são muito carinhosas, calmas e amigáveis, gostam das mesmas coisas que os seus colegas, gostam de brincar, de correr, de ouvir música e ver televisão. Se percebermos os gostos delas e desenvolvermos actividades interessantes para elas, de certeza que a adaptação será melhor. É mais fácil elas adaptarem-se a nós do que nós (comunidade escolar) a elas. Por isso é mudando mentalidades e destruindo mitos há volta desta problemática que vamos facilitar o processo de adaptação. Outro aspecto fundamental é o papel das famílias destas crianças, a família tem que ser envolvida na e pela escola, têm que ser mais apoiadas e ajudadas pela comunidade escolar. Existem famílias mais problemáticas que outras, mas o mais importante é a criança, e para ela os seus pilares serão sempre a família e a comunidade escolar, se houver um “trabalho de equipa” entre todos a adaptação será muito boa. Estas crianças têm muito para dar e devem ser encaradas como exemplos de vida para todos nós. 6. Porque escolheu trabalhar com este tipo de crianças? R: Desde pequena que convivi com crianças diferentes, não gosto de usar a palavra “deficiente” pois tem uma conotação muito negativa. A minha mãe trabalha na APPC (Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral) e para além dos meus amigos da escola e tinha estas crianças diferentes com quem brincar. Desde muito cedo que percebi que as brincadeiras com elas eram muito interessantes, tinha que descobrir novas maneiras de comunicar com eles, lembro me que lhes fazia muitos desenhos a contar as minhas aventuras e eles também o faziam para mim. Fiquei fascinada, pois apesar das limitações físicas e psicológicas, eu conseguia percebe-los e acima de tudo estava a tornar o quotidiano deles mais colorido. Quando terminei o 12º ano, já tinha a minha decisão tomada, iria escolher um curso onde pudesse ajudar estas crianças, foi então que optei pela Fisioterapia. É claro que a Fisioterapia é muito abrangente e não se trabalha só com crianças, mas o meu carinho por estas crianças é tão grande que fui direccionando a minha prática e formação profissional para estas crianças diferentes. Como fisioterapeuta, tento sempre facilitar e potenciar as suas capacidades, e como pessoa todos dias tenho um motivo para sorrir, ajudo a colorir o dia-a-dia destas crianças e elas ajudam-me a valorizar a vida. 7. Que tipo de avanços nota nas crianças durante os tratamentos? R: Após uma avaliação da criança, são definidos objectivos a curto prazo e o consequente plano de tratamento. Este vai variar consoante os problemas e a idade da criança. Ao longo do tratamento vão se verificando melhorias significativas, a criança realiza mais facilmente algumas actividades motoras, interage e comunica mais, vai adoptando uma postura mais adequada, torna-se mais resistente e coordenada durante os exercícios de actividade física. De frisar que este é um processo longo no tempo. Mas cada criança é um caso e os objectivos devem ser claros, alcançáveis e realistas, sendo definidos em conjunto com a família, para que não sejam criadas falsas expectativas em relação à criança. 8. Já alguma vez fez voluntariado numa associação? R: Sim, quando estava no 12º ano, nas férias de verão, fiz um programa de ocupação dos tempos livres do Instituto Português da Juventude, onde durante um mês fui voluntária na APPC de Viseu. Como voluntária ajudava nas actividades da vida diária destas crianças e adultos, como por exemplo na alimentação e higiene, além disso desenvolvia, em conjunto com os técnicos da instituição várias actividades lúdicas (passeios, jogos) para realizarmos em conjunto com as crianças e jovens da instituição. 9. Se sim, que lhe ensinou essa experiência? R: Para mim foi uma experiência muito enriquecedora e gratificante. Como já tinha mencionado, eu já conhecia estas crianças e muitas vezes brincava com elas, no entanto, ao realizar este voluntariado apercebi-me das suas verdadeiras necessidades, em coisas tão simples como o comer, o despir/vestir, a própria higiene. Tive noção dos problemas reais que atravessam, além disso nas saídas que fazíamos até ao centro da cidade, vivenciei as dificuldades/barreiras arquitectónicas por que passavam. Já para não mencionar no olhar e comentários das restantes pessoas à nossa volta, que muitas vezes eram preconceituosos. Apercebi-me que a sociedade não conhecia verdadeiramente estas crianças/adultos, e mais do que isso, tive a sensação que não queriam conhecer nem fazer parte deste universo diferente. Lembro-me de ficar horrorizada e angustiada com este pensamento, não conseguia perceber porque éramos tão insensíveis para estas pessoas. Eu também já tinha sido assim, não me preocupava com eles, para quê? Na minha cabeça iria sempre haver instituições para ficar com estas pessoas diferentes, eu não tinha que me preocupar! Não podia estar mais enganada, eles precisam da sociedade e nós deles, eles precisam de se sentir integrados e nós precisamos da força de viver deles… A partir dessa altura soube o meu futuro, iria escolher uma profissão onde pudesse contactar com estas crianças e ajudá-las a ultrapassar as suas limitações motoras e psicológicas, e iria também ajudar a nossa sociedade a recebe-los como eles realmente merecem, como se fossem (e são) iguais a qualquer um de nós! 10. Considera que a nossa sociedade tem evoluído ao longo do tempo no que toca ao modo com vêm e tratam as pessoas com síndrome de down? R: Eu penso que a sociedade tem evoluído no que diz respeito há integração destas crianças na sociedade. Já vemos estas crianças no ensino regular, existe uma maior preocupação pela comunicação social em abordar a problemática da trissomia 21, e as pessoas já têm mais informação sobre a doença estando mais receptivas em recebê-las na sociedade. Só há poucos anos é que surgiram estes projectos de apoio às crianças com necessidades educativas especiais, em que se destacam técnicos especializados para prestar apoio que dantes era inalcançável ou de acesso mais restrito. Já é um sinal de que os tempos mudaram… Apesar destas melhorias bastante significativas, eu penso que ainda há muito por fazer, e devemos insistir na educação das crianças e jovens para acolherem do melhor modo estas crianças. Como se sabe é na comunidade escolar (professores, auxiliares e colegas) que as crianças vão definindo alguns dos seus valores e princípios, por isso nada melhor que desde cedo serem abordadas estas temáticas nas aulas, os professores devem abordar nas aulas, não só a trissomia 21 mas também a paralisia cerebral, o autismo e até os atrasos mentais. Quanto mais cedo forem incutidos nas crianças estes valores de igualdade, partilha e aceitação das diferenças, mais inclusiva será a nossa sociedade no futuro. 11. Também trabalha ou já trabalhou com adultos? R: Para além da CERCI trabalho num lar de idosos, no entanto não contacto com adultos com trissomia 21. Deixo aqui uma questão: Para onde irão os idosos com trissomia 21? Os lares de idosos nem sempre são receptivos a estas pessoas, e é uma grande preocupação para a família destas crianças, não saberem quem irá tomar conta dos seus filhos quando estes forem mais velhos. Por isso, não valerá apenas mudarmos estas mentalidades e criarmos uma sociedade inclusiva a todos os níveis? Não só nas escolas mas também nos locais de trabalho, nos serviços de saúde, nos lares…